domingo, 26 de junho de 2011

O pior ainda está por vir??

Udelton da Paixão

Já se vão quase 30 anos de um evento que fui partícipe no auditório da Escola Estadual Antonio Carlos, quando o então prefeito de Paracatu, Diogo Soares Rodrigues, antes de entregar o Alvará de Localização e Funcionamento à Mineradora RTZ, exigiu uma audiência pública desta com a comunidade paracatuense. Desde aquele momento eram grandes as preocupações com os impactos ambientais que as atividades de mineração iriam trazer ao município.

Os anos se passaram e fomos obrigados a aprendermos a conviver com os benefícios econômicos que a atividade trouxe à cidade. Recebemos inúmeras pessoas que vieram fazer parte de nossa comunidade, trabalhando na mineradora. A cidade acolheu estas pessoas como sempre faz com todos que aqui vêm viver.

Porém, nossas preocupações não se amenizaram. Pelo contrário, a cada dia aumenta nossa insegurança quanto ao futuro. Não sou nenhum especialista na área, mas me sinto no dever de levantar mais uma questão que nos últimos dias povoa minha consciência e me pede para trazê-la a público.

Temos nos preocupado, com razão, com os danos causados à nossa saúde pela mineração. No entanto, existe um problema de extrema importância que pertence ao futuro, que pode ser daqui a 05, 10, 20, 30 anos, não podemos precisar. Mas que precisaria ter sido pactuado desde o início, que é o Processo de Recuperação da Área Degradada - PRADs e o Fechamento da Mina.

A legislação brasileira, na época, não exigia este procedimento nos ritos de liberação das licenças ambientais, porém passaram a ser exigidos. E a RTZ, realizou os estudos no sentido de prever o trabalho que seria feito para recuperação e fechamento da Mina, o PRADs (Plano de recuperação de Áreas Degradadas. Eu mesmo participei em pelos menos dois eventos promovidos pela empresa para apresentar este trabalho à comunidade.

A questão que levanto neste momento, diz respeito aos recursos necessários para que seja feito este trabalho de recuperação da área degradada, para que seja “devolvida” à comunidade. Na ocasião apresentou-se como ficaria a área explorada após o trabalho de recuperação. Porém não disseram de onde viriam os recursos para a realização destas obras.

O fechamento de uma mina ocorre justamente num momento em que a empresa já não está mais operando, portanto em um momento em que não mais existem receitas provenientes da venda do minério. É onde nascem minhas preocupações. Diga-se, de passagem, que isto já vem sendo debatido em outros países como Austrália, Estados Unidos e o próprio Canadá, que já se encontram em um estágio bem mais avançado em relação ao Brasil, no que diz respeito a este tema. Embora exista todo um ritual a ser feito junto ao Ministério das Minas e Energia, precisamos de garantias financeiras, pois depois do leite derramado não adianta chorar.

No Brasil, no campo da legislação ambiental, somente recentemente vem sendo regulamentado os procedimentos a serem adotados, pelas empresas mineradoras, para fechamento de minas.

Voltemos a Paracatu e analisemos. A RTZ explorou o filé do Morro do Ouro, por mais de duas décadas e de repente venderam a empresa a outra mineradora. As razões reais de sua saída é segredo empresarial. Para o público a resposta é outra, o que é lógico.

Porém, não deveria a RTZ, ter deixado sua parcela de recursos garantida em banco correspondente ao tempo em que explorou e degradou o meio ambiente em nossa cidade, a fim de custear os gastos com a recomposição ambiental?

A RTZ vendeu a RPM, para a KINROSS, que explorará a mina até que obtenha a compensação dos seus investimentos. Quando perceber que chegou à exaustão, buscará repassa-la a outra empresa, para se furtar da incumbência de recompor o meio ambiente degradado.

A partir desta hipótese, imaginemos se sucedê-la outra empresa do ramo, de menor porte (uma grande dificilmente embarcaria nesta canoa furada), e esta não queira arcar, logicamente, com a recuperação ambiental proveniente de uma atividade que praticamente não foi ela que desenvolveu.

Em resumo, sobrará ao poder público municipal, o ônus de conviver com este problema chamado “Morro do Ouro”, travando uma infinita briga no judiciário.

Mas qual a solução?

A Kinross precisa ser chamada a apresentar à comunidade, concretamente, o que tem de previsto para o processo de fechamento da Mina. É necessário orçar os valores que seriam necessários para realização desta obra e, finalmente, que seja oferecido uma garantia financeira de alguma natureza, depósito remunerado, carta de crédito ou coisas do gênero. À medida que a exploração avança, e como indicam estudos realizados sob o tema, estes cálculos precisam ser refeitos periodicamente.

Esta preocupação pode parecer sem sentido, mas a literatura, esta repleta de casos, de mineradoras que faliram e deixaram barragens de rejeitos abandonadas, áreas de lavras sem recomposição da vegetação, e por aí vai.

Portanto, acho que este tema precisa ser colocado na pauta tanto pelo Ministério Público do Meio Ambiente, como também pelo Governo Municipal, entidades sindicais, ambientais, associações de moradores e por toda a sociedade organizada de Paracatu.

Caso contrário, estaremos condenados a mantermos uma relação de favores com a empresa, como patrocínio de shows, pequenas verbas para entidades sociais. E o que de fato precisa ser discutido pode ficar escamoteado e esquecido no tempo, até que um dia seja tarde, e último ouro que já é pó, tenha sumido de vez na poeira das máquinas da Kinross, rumo ao Canadá.

Um abraço a todos!

Penso, logo, resisto.

Udelton da Paixão Espírito Santo, é bacharel em Direito, vice-presidente da Cáritas Diocesana de Paracatu e ex-vice-prefeito.

4 comentários:

  1. Udelton, muito boas e procedentes as preocupações levantadas. Não podemos ser pegos de calças curtas depois. A respeito da criação de um fundo para compensações o Ministério Público ajustou um TAC para tal fim, não sei como está o andamento. Devemos ajudar a levantar esta questão para cobrar a efetividade da solução. Outro caso que nos preocupa e não estamos vendo notícias é o levantamento epidemiológico para ver os efeitos da poeira (com arsênio?). A prefeitura já contratou uma empresa e não temos notícias nenhuma. Temos de cobrar. Lembro ainda que haverá amanhã uma audiência pública as 13 horas na Câmara sobre este assunto, devemos convocar todos!...

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  2. O meu amigo Udelton, parabéns pela reflexão. Ao menos você esta fazendo a sua parte. Esperamos que esse texto seja um pontapé de discussões de ações de bem estar da comunidade de Paracatu/MG.

    Guilherme Assoni Monte Sião/MG

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  3. Caro colega, há muito trabalho pela frente, principalmente quanto se fala em financeiro. Realmente não há amparo em nossa legislação, mas há realmente a necessidade de se levantar esta necessidade e levá-la ao conhecimento da sociedade.

    Abraços

    Janaina Cristina

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  4. Parabéns Udelton.
    Eu tenho guardadas todas as propostas "malucas" do Dr. Sérgio Dani. Daqui há alguns anos, que vai passar rápido, se ainda estivermos vivos teremos a oportunidade de viver a dura realidade, que espera pela população de Paracatu.Muitos irão lembrar do Sérgio Dani.
    Grande parte dos moradores desta cidade, ainda defendem ardorosamente a Mineradora, porque alegam que sem ela irão morrer de fome, juntamente com seus familiares. Assim ficamos todos quietos, vivendo a nossa situação de forma silenciosa para não "ofendermos" esta Empresa "benfeitora da cidade, das entidades que recebem suas pequenas doações e de meia dúzia de paracatuenses, que ainda são empregados, como se fosse um favor ao povo.
    Esta empresa tem que deixar valor suficiente, não só para a recuperação da área degradada, mas para a manutenção das pessoas doentes, contamindas,com certeza irão necessitar de laboratórios e hospital equipado com todos os recursos necessários para o tratamento das doenças que já estão afetando todos nós.
    Onde estão os políticos, os sindicatos, os órgãos ambientais (sabemos que eles existem) e a população?
    Ainda não temos argumentos suficientes para nos indignarmos?
    Então esperemos...
    Acessem: www.verdminas.ning.br

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