A polêmica do Projeto de Lei 84/99, que tipifica crimes na internet, teve início desde sua apresentação na Câmara. Apesar disso, quatro anos depois, em 2003, o PL foi aprovado e seguiu para o Senado, quando recebeu um texto substitutivo do então senador e atual deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB/MG). Mais uma vez, o projeto não só foi aprovado no Senado como, reencaminhado para a Câmara, tramita agora em regime de urgência em cinco comissões: Ciência e Tecnologia; Comunicação e Informática; Constituição, Justiça e Cidadania; Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, de onde seguirá para votação no plenário.
Para os parlamentares contrários ao substitutivo, neste momento resta apenas a possibilidade de apresentarem emendas supressivas às propostas aprovadas no Senado uma vez que, caso o texto seja rejeitado na íntegra, será validada a versão original aprovada em 2003. Já a sociedade civil e o setor acadêmico – partes diretamente afetadas pela lei – nem sequer foram convidadas a participar da decisão nestes 12 anos de debate.
Chamada pelas entidades civis contrárias à sua aprovação de AI-5 Digital, a “Lei Azeredo” foi inspirada na Convenção de Budapeste, que tratou sobre o tema do cybercrime e foi assinada poucos meses após os atentados ao World Trade Center, em 2001. Por trás das justificativas para a aprovação da Convenção estava o interesse de grandes empresas e governos em acabar com a neutralidade da rede e, dessa forma, controlarem o acesso à internet.
Na semana passada, numa tentativa de conter os prováveis estragos no direito à liberdade de expressão dos brasileiros, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) entrou em acordo com o deputado Eduardo Azeredo para que seja realizado um seminário sobre o assunto antes da votação do texto nas comissões. O requerimento para a audiência foi apresentado na última quinta-feira, dia 28, e ainda aguarda uma resposta.
Uma das principais críticas à lei é a sua abordagem generalizada. Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), se aprovada, a lei pode criminalizar ações cotidianas como possuir um blog, fazer a digitalização de filmes e músicas e o desbloqueio de aparelhos celulares. Atividades extremamente importantes para o desenvolvimento do país como as redes abertas (P2P), pesquisas e o uso de obras protegidas por copyright como fonte de informação e educação serão diretamente afetadas.
Um país que ainda não foi capaz de aprovar o Marco Civil para Internet, dificilmente tem a maturidade necessária para construir leis e regras capazes de determinarem o que pode ser considerado crime ou não na rede. O Marco Civil reivindicado pela sociedade trata de pontos que precedem em relevância o debate da Lei Azeredo, dentre eles o livre acesso à internet como direito básico, a neutralidade da rede, a criação de regras de responsabilidade civil para provedores e usuários e medidas capazes de preservarem a liberdade de expressão e a privacidade. Além de princípios e diretrizes para garantirem o bom funcionamento da rede.
Nós, do Instituto Telecom, defendemos que o Marco Civil da Internet deve ser aprovado antes de qualquer discussão que vise regular os conteúdos e dados da rede. É preciso ouvir todas as partes envolvidas para ser capaz de tomar decisões que podem mudar completamente o rumo e a liberdade do país. A decisão da sociedade civil é pela não aprovação desta lei. Isto está mais do que claro. Só na última semana, o deputado Emiliano José (PT-BA) apresentou ao presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), uma petição contrária à proposta sobre crimes na internet com 163 assinaturas de representantes dos setores empresarial, civil e acadêmico.
O Brasil não pode, de forma alguma, retroceder nas conquistas duramente alcançadas pela sociedade após décadas de ditadura. Aprovar a Lei Azeredo sem levar em conta os argumentos contrários e os desejos da sociedade, é levar o país a um novo AI-5.
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