quinta-feira, 14 de março de 2013

Os Franciscos brasileiros





 Zé Geraldo

Agora que o primeiro papa latino americano teve a inédita iniciativa de escolher o nome daquele que Leonardo Boff costuma chamar o primeiro depois do Único, é preciso lembrar também que o Brasil é uma mãe que criou muitos Franciscos.

Dentre eles, é possível citar três grandes ícones da Igreja Católica que, apesar de não trazerem o nome Francisco na certidão de nascimento, doaram a vida pelos menos favorecidos, assim como aquele de Assis. Dom Helder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns e Dom Pedro Casaldáliga são os mais genuínos exemplos da unidade entre a fé e a ação libertadora em favor dos pobres.

Todos eles foram lideranças combativas contra a sanguinária ditadura que, assim como na Argentina, manchou longos anos da história. Embora ameaçados, coagidos, nunca cederam a tentação do silêncio e sempre estiveram prontos a mobilizar e fortalecer todos que acreditavam ser possível livrar o país dos tiranos fardados e buscar incessantemente a inclusão social dos pobres.

Conhecido como Bispo Vermelho, Dom Helder Câmara desejava uma Igreja mais participativa, orientada para a defesa dos pobres e a favor dos movimentos sociais. Depois do golpe militar, após um primeiro período de convivência pacífica com o exército, ao ver a violação brutal dos direitos humanos com a caça aos chamados comunistas, dom Helder passou a atuar em defesa dos presos políticos e contra a tortura no Brasil. Depois de afastado da arquidiocese viveu até o fim dos seus dias de maneira simples e franciscana. Costumava dizer que "Quando dou de comer aos pobres, chamam-me santo, quando respondo por que é que os pobres têm fome - chamam-me comunista".

Simples e combativo, Dom Paulo Evaristo Arns foi um incansável defensor dos direitos humanos no Brasil, principalmente durante a ditadura. Defendeu também os líderes sindicais nas greves, apoiou a campanha contra o desemprego e o movimento pelas eleições diretas. Sua luta em defesa dos direitos dos pobres e pelo fim da desigualdade social lhe valeu dezenas de prêmios no mundo.  Apoiou fortemente o grupo Tortura Nunca Mais e foi um dos escritores do livro “Brasil: Nunca Mais”, um doloroso relato da repressão e tortura no Brasil. Sempre entendeu que a Igreja deveria fazer a opção preferencial pelos pobres e oprimidos.

Nada possuir, nada carregar, nada pedir, nada calar e, sobretudo, nada matar”, esse sempre foi o lema de Dom Pedro Casaldáliga. Nascido na Espanha, mas radicado no Brasil, Casaldáliga sempre foi um defensor das minorias e por isso foi várias vezes ameaçado de morte. As últimas ameaças foram no final do ano passado e no início deste ano e se deram em função da defesa que o bispo faz do povo xavante na retomada da terra indígena Marãiwatsèdè. Durante o regime militar, foi alvo de processos de expulsão do Brasil. É considerado uma das principais vozes dos índios, dos sem terra e dos mais pobres.

Além desses três ícones da Igreja Católica, dois outros Franciscos merecem ser lembrados. Um nasceu em Minas Gerais e dedicou sua vida para atender a todos que o procuravam, pobres ou não. Autor de verdadeiros best-sellers, Francisco Cândido Xavier direcionava tudo que recebia com a venda dos livros para obras de caridade. Seus hábitos franciscanos de viver marcaram toda a sua trajetória até o fim da vida.

Por fim, não dá pra falar de Franciscos que dedicaram a vida às causas dos pobres sem falar de um Chico: Chico Mendes. O seringueiro, reconhecido mundialmente pela defesa da floresta e de seus povos, indignou-se com as condições de vida dos trabalhadores e dos moradores da região amazônica e tornou-se um líder do movimento de resistência pacífica. 

Assim como Francisco de Assis, todos optaram por uma forma de luta baseada no amor e na paz. Sem nenhum gesto de violência ou arrogância e nenhum vestígio de ódio.

Cada um a seu jeito, demonstrou o que é ser, de fato, um Francisco.

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