quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A voz das urnas de 2012

Paulo Moreira Leite

Confesso que o sorriso amarelo dos coveiros de Lula e do PT é um dado preocupante de nosso momento político.
 
Explico. Nos tempos da ditadura, o grande Ulysses Guimarães, personalidade maior da resistência, dizia que era preciso ouvir a voz das ruas. É que naquele tempo, com a imprensa censurada, os deputados cassados, os partidos reprimidos, o país falava pelas ruas. Eram passeatas, protestos e greves.
 
Quem ouviu a voz das ruas se deu bem. Percebeu o rumo da história, modificou prioridades, apostou na direção do futuro. Quem não entendeu isso ficou olhando a vida passar pela janela.
 
A voz das urnas de 2012 é muito clara. Olhe só:
 
a) o PT recebeu o maior número de votos da campanha. Ou seja: no país inteiro, 17, 3 milhões de brasileiros saíram de casa, há dois dias, para votar em candidatos deste partido; o PSDB teve 3 milhões de votos a menos;
 
b) o PT ganhou 14% a mais de prefeituras, enquanto o PSDB perdeu 12% e o PMDB perdeu 14%;
 
c) entre as cidades de mais de 200 000 habitantes, o PT foi melhor que os outros; emplacou 8 prefeitos no primeiro turno e disputará 22 prefeituras em segundo turno; o PSDB, que ficou em segundo, ganhou 6 e disputa 17;
 
d) entre partidos menores, o PSB cresceu muito. O número de prefeituras aumentou 43%. Vamos lembrar: o PSB não é um partido de oposição nem é neutro. Faz parte da base do governo Dilma e colhe os benefícios do crescimento do Nordeste, acelerado a partir de 2003. A maior vitória do PMDB ocorreu no Rio de Janeiro e envolve uma aliança federal e municipal entre o Planalto e os pemedebistas de Sérgio Cabral e Eduardo Paes. Eles também são aliados de Lula e Dilma. Numa cidade célebre por seu oposicionismo, onde se vaia até minuto de silêncio, a situação teve 64% dos votos.
 
e) o PSD surgiu hoje como a quarta legenda. Vamos lembrar: quando Gilberto Kassab disse que ia fazer um partido que não era de esquerda nem de direita, ele queria dizer que estava indo da direita para a esquerda – e se aproximava de Dilma. Tomou porrada por isso. Não por uma suposta impureza ideológica.
 
Estes dados me parecem sólidos o suficiente para dizer quem ganhou a eleição. Em função do segundo turno, é cedo para medir o resultado pelo número final de prefeituras conquistadas. Este aspecto é importantíssimo.
 
Mas para medir a vontade do eleitor, este é o melhor momento. Todo mundo teve direito de levar sua mensagem a TV, dar porrada, levar porrada, e o saldo está aí.
 
Voltando à mensagem da rua e das urnas.
 
Quem não entendia a mensagem da rua, no tempo da ditadura, partiu para a ignorância. O povo dizia que queria democracia e eles até atrapalhavam a abertura lenta e gradual. Matavam presos políticos para criar crises e elevar a tensão. Promoviam atentados terroristas, com a mesma finalidade. Fizeram a bomba do Rio Centro, explodiam bancas de jornal. Assassinaram dona Lida, secretaria da OAB. Infiltravam-se em greves, assembleias, passeatas.
 
Essa reação criminosa é inaceitável mas pode ser explicada. Incapaz de dar respostas à história, o que dificulta até o dialogo com os próprios filhos, o sujeito procura ressuscitar o passado através de ações criminosas.
 
É aquela cena de filme de terror classe B em que o morto vivo ressurge de dentro da terra.
Também temos, em 2012, quem não consegue sequer ouvir a voz das urnas.
 
E isso é um problema?
 
Eu acho. Não digo que leva o cidadão para o terrorismo. Não obrigatoriamente rsrsrsrs.
 
Mas leva ao jogo sujo. Leva a mentira, a trapaça. Por que? Porque a pessoa parou de trabalhar com a realidade, deixou de olhar para aquilo que eu e você podemos ver – e que o números de domingo mostram – para jogar com sua própria fantasia. Não aceita que a maioria dos cidadãos aprove um governo que realizou mudanças modestíssimas, precárias, etc, mas que lhe permite viver um pouco melhor, comer um pouco melhor e assim por diante.
 
E é da democracia aceitar que a maioria – mesmo a mais humilde, menos educada formalmente – tem o direito de optar por seu destino. É democrático procurar entender o que a maioria diz e pretende. Até para tentar convencê-la a mudar de pensamento, se for o caso.
 
Quem não enxerga a maioria, não compreende o que ela diz, tem reações autoritárias. Parte para o baixo nível, o jogo sujo, a mentira.
 
E é este, só este, meu receio para o segundo turno. Negar o que as urnas disseram, há dois dias, é procurar um caminho para a baixaria que todos conhecemos e lamentamos. Ou será que para alguns não há alternativa?
 
Deu para entender, certo?

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