Artigo de André Singer destaca o retorno do ex-presidente Lula ao jogo eleitoral, anunciado no discurso do cabalístico 12/12/12 em Paris; em diversos trechos, Lula falou como se ainda fosse presidente ou pretendesse voltar a sê-lo
247 - Porta-voz de Lula em seu primeiro mandato, o jornalista e cientista político André Singer aposta: o ex-presidente está voltando. E anunciou o retorno no discurso feito em Paris, no cabalístico 12/12/12. A fala, segundo Singer, lembraria a célebre entrevista de Getúlio Vargas a Samuel Wainer, em que o "pai dos pobres" anunciou: "Eu voltarei".
Singer pinçou vários trechos da fala em que Lula falou como se ainda fosse presidente ou pretendesse voltar a sê-lo. Como, por exemplo, quando falou do "meu ministro da Economia" ou quando sugeriu novos encontros de presidentes, incluindo-se no grupo.
Outro ponto relevante do discurso, segundo Singer, foi a crítica aos banqueiros, que, segundo se comenta no círculo lulista, tem endereço certo no Brasil (leia mais aqui). Abaixo, o artigo se Singer na Folha deste sábado:
Voltei
André Singer
O discurso de Lula anteontem em Paris deve ser lido com atenção. Não só porque foi mencionada a chance de nova candidatura, o que lhe dá sabor histórico. Quiçá, no futuro, o cabalístico 12/12/12 fique como o dia da célebre entrevista em que Getúlio anunciou a Wainer: "Eu voltarei".
Para os que buscam sinais, aliás, convém anotar outras passagens. A certa altura, o antigo mandatário deixa escapar: "Se é verdade o número que o meu ministro da Economia falou na hora do almoço...". Adiante, afirma aguardar que "a gente consiga fazer um acordo mais razoável" na conferência do clima prevista para se dar em Paris em 2015. Já quase ao final, solta o seguinte: "Espero que os presidentes das Repúblicas não se reúnam mais para discutir crise. Nós temos que discutir soluções".
Os indícios esotéricos espalhados em uma hora e 20 minutos de duração não constituem, contudo, os elementos centrais do pronunciamento. Se o ex-metalúrgico será ou não candidato em 2014, depende de fatores cujo controle escapa a qualquer um. Interessa a disposição atual do personagem e, acima de tudo, o programa com que sobe ao palanque.
O orador fez, com voz firme, diagnóstico amplo da crise econômica mundial e dos consequentes desafios postos aos homens e mulheres de Estado no início do século 21. Os ouvintes que se deixarem levar pela forma -a aparência simples dos enunciados- perderão a abrangência do raciocínio, concorde-se com ele ou não.
Para Lula, os impasses chegaram a tal ponto que ou a política reassume o comando para preservar os avanços obtidos depois da Segunda Guerra Mundial ou caminharemos para o pior. Comparando a situação europeia -epicentro de processo regressivo mais geral- a um paciente com a perna já amputada, disse que "se demorar mais um pouco, poderá morrer".
Mas diante de quadro tão grave, o que impede os Estados de agirem para interromper a gangrena, salvando o bem-estar social e devolvendo perspectivas de desenvolvimento para o conjunto da humanidade? Quem são os tão poderosos inimigos da raça humana? Aí a surpresa. Refratário, em condições normais, a nomear adversários, o ex-presidente, nas derradeiras frases, decidiu colocar pingos nos "is". "Essa crise é da responsabilidade de pessoas que nós nem conhecemos porque, quando o político é denunciado, a cara dele sai de manhã, de tarde e de noite no jornal. Vocês já viram a cara de algum banqueiro no jornal?"
Acaso fosse necessária indicação adicional sobre como, na visão de Lula, estariam relacionadas a esfera global e as acusações de corrupção no Brasil, fez questão de arrematar: rosto de banqueiro não aparece "porque é ele que paga a propaganda".
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