A juíza substituta da 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, Raquel Vasconcelos Alves de Lima, se declarou incompetente para julgar os acusados de matar, em 2004, três fiscais do Trabalho e um motorista; o processo deve ser encaminhado para julgamento na Vara Federal de Unaí, criada em 2010
Alex Rodrigues
Repórter
Agência Brasil
Brasília
– A
juíza substituta da 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte (MG), Raquel
Vasconcelos Alves de Lima, se declarou incompetente para julgar os acusados de
matar, em 2004, três fiscais do Trabalho e um motorista, também servidor do
Ministério do Trabalho. Segundo a assessoria da juíza informou à Agência Brasil na
tarde de hoje (25), o processo deve ser encaminhado para julgamento na Vara
Federal de Unaí, criada em 2010.
Os quatro servidores públicos foram
mortos a tiros em 28 de janeiro de 2004, quando faziam uma fiscalização de
rotina na zona rural de Unaí, a cerca de 500 quilômetros da capital mineira,
Belo Horizonte, e a apenas 160 quilômetros da região central de Brasília (DF).
O caso ficou conhecido como a Chacina de Unaí.
Ainda
não foi divulgada a justificativa da juíza para declinar da competência do
processo, decisão que ocorre a apenas três dias de o crime completar nove anos.
A decisão também é anunciada poucos dias após o corregedor nacional de Justiça
interino, Jefferson Kravchychyn, ter declarado que a juíza se comprometera a
marcar o início do julgamento para fevereiro. A intervenção
da Corregedoria Nacional de Justiça foi solicitada pelo Ministério Público
Federal no início de janeiro.
A decisão da juíza foi criticada por
entidades de classe e pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos e
Minorias da Câmara dos Deputados, Domingos Dutra (PT), que já havia agendado
uma reunião com a juíza para a próxima segunda-feira (28), quando o crime faz
nove anos.
“Queremos que o Poder Judiciário cumpra
seu papel, marque a data do julgamento para o mais breve possível e que os
acusados sejam condenados como forma de inibir a impunidade. Nove anos para um
crime que abalou o país e que motivou a aprovação de um lei instituindo o Dia
Nacional de Combate ao Trabalho Escravo é muito tempo”, comentou o deputado.
Domingos Dutra acredita também que o
julgamento em Unaí compromete a isenção do processo, porque são pessoas
influentes na comunidade.
Em nota, o Sindicato Nacional dos
Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) anunciou que, junto com a Associação dos
Auditores Fiscais do Trabalho de Minas Gerais (Aafit), vai recorrer ao Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF1), ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao
Superior Tribunal de Justiça (SJT) e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para
evitar que o processo seja encaminhado para a Vara Federal de Unaí, onde, de
acordo com a entidade, “a possibilidade de interferências políticas e
econômicas é grande”.
A procuradora da República Miriam Moreira
Lima, autora da denúncia contra os nove réus que se transformou no processo
aberto na 9ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, também prometeu
recorrer da decisão. As vítimas da chacina foram os auditores do Trabalho
Erastótenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da
Silva, e o motorista Ailton Pereira de Oliveira.
A Polícia Federal concluiu as
investigações do caso em seis meses e pediu o indiciamento de nove pessoas por
homicídio triplamente qualificado: os fazendeiros e irmãos Antério Mânica
(ex-prefeito da cidade e um dos maiores produtores de feijão do país) e
Norberto Mânica; os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro e
Francisco Elder Pinheiro; além de Erinaldo de Vasconcelos Silva e Rogério Alan
Rocha Rios, apontados como autores do crime; Willian Gomes de Miranda, suposto
motorista da dupla de assassinos, e Humberto Ribeiro dos Santos, acusado de
ajudar a apagar os registros da passagem dos pistoleiros pela cidade.
Um dos réus, o empresário Francisco
Elder, faleceu no último dia 7, com 77 anos de idade. Ele aguardava o
julgamento em liberdade. Dos outros oito indiciados, Erinaldo, Rogério e
Willian estão presos em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, à
espera da sentença judicial. Ribeiro dos Santos foi solto a pedido do
Ministério Público Federal, já que seu crime prescreveu.
Os
outros quatro réus, coincidentemente os que têm maior poder aquisitivo,
aguardam o julgamento em liberdade, beneficiados por habeas corpus da
Justiça. Pouco depois do crime, Antério Mânica foi eleito prefeito de Unaí,
tendo sido reeleito em 2008.
Ao longo dos anos, os réus apresentaram
sucessivos recursos e apelações que contribuíram para a demora no julgamento. A
demora levou a subprocuradora-geral da República e coordenadora da Câmara
Criminal do Ministério Público Federal, Raquel Dodge, a recorrer ao Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) para que o caso seja julgado logo.
No ofício que enviou no último dia 8 ao
corregedor nacional de Justiça interino, conselheiro Jefferson Kravchychyn, a
subprocuradora classifica o crime como um “cruel assassinato”. Ela disse que,
há pelo menos seis meses, não há nenhum obstáculo que impeça a juíza Raquel
Vasconcelos de incluir o caso na pauta de julgamentos.
Para
que impedir que crimes como esse caiam no esquecimento e fiquem impunes, foi
instituído o dia 28 da janeiro, data do crime, como Dia Nacional de Combate ao
Trabalho Escravo, por meio da Lei
12.064/09. Este ano, entidades de defesa dos direitos humanos e órgãos
públicos vão realizar atividades em mais de 15 cidades do país todo.
Edição:
Davi Oliveira
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