O número que mais me chamou a atenção no Datafolha divulgado domingo, em que Dilma bate mais um recorde de aprovação e Lula aparece como o favorito para as eleições de 2014, foi o índice de "ruim e péssimo" registrado pela pesquisa: 5%.
Pode chover ou fazer sol, a bolsa e o dólar subirem ou caírem, a economia ir bem ou mal, o País melhorar ou piorar, que este contingente de insatisfeitos com o governo não muda de tamanho.
Dentro da margem de erro, um ponto a mais ou a menos, a turma do contra permanece imutável há anos. Podem até mudar seus integrantes, mas o contingente é o mesmo.
Desde o segundo mandato de Lula, me chama a atenção a permanência deste índice de 5% de "ruim e péssimo", ou seja, dos que desaprovam o governo.
Na primeira vez em que escrevi sobre este assunto, já faz algum tempo, por mera curiosidade jornalística, sugeri que se fizesse uma pesquisa sobre o perfil destes insatisfeitos, saber as razões deles, entender o pensamento de quem acha tudo ruim ou péssimo.
Para quê... Por ignorância ou má-fé, ou as duas coisas juntas, alguns blogueiros neuróticos anônimos me acusaram de "estar chamando a polícia para identificar os que eram contra o governo e apresentá-los à execração pública como os nazistas fizeram com os judeus", absurdos deste tipo.
Confundiram, propositadamente, pesquisa de opinião, que pode traçar o perfil dos entrevistados (por classe social, idade, região), com investigação policial para "identificar, perseguir e banir" os que não apoiavam o governo.
Açulados por estes blogueiros, muitos seguidores das seitas internéticas invadiram o Balaio na época repetindo as mesmas sandices.
A pesquisa até hoje não foi feita por nenhum instituto, mas estou desconfiado de que há uma relação direta entre estes 5% e as pessoas que se informam apenas pelo que lêem nos principais jornais nacionais e nas maiores revistas do País.
Fiz umas contas e cheguei à conclusão de que o contingente é mais ou menos o mesmo. Os 5% do contra representam uns 10 milhões de brasileiros. Dez milhões é menos do que o total de exemplares destes jornais e revistas somados que circulam durante toda uma semana.
Como a imprensa não fala da imprensa, e parece haver um pacto entre os donos da grande mídia reunidos no Instituto Millenium, raramente um veículo critica ou sequer cita o outro.
O silêncio foi quebrado esta semana pela revista "Época", que citou nominalmente a sua concorrente Veja, em meio à matéria ""Fui afastado pela negociata de uma empreiteira e um contraventor", uma entrevista com o ex-diretor-geral do Dnit, Luiz Antonio Pagot, demitido durante a crise que levou à queda do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, no ano passado.
Trecho da reportagem de Murilo Ramos:
"O afastamento de Pagot, bombardeado por acusações de cobrar propinas, foi comemorado pela turma de Cachoeira. Quase dois meses depois de ter ouvido de Cachoeira que a imprensa recebera material contra a diretoria do Dnit, Abreu (diretor da empreiteira Delta) telefonou para o bicheiro. Em tom de galhofa, diz durante a conversa que a presidente Dilma Rousseff ordenara ao então ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, afastar todos os citados em reportagem publicada pela revista Veja. Naquele momento, Abreu e Cachoeira dividiram elogios entre eles e enalteceram a força de sua associação".
Associação para quê? Entre outras coisas, certamente, para plantar notícias na imprensa. De fato, foi uma reportagem da revista Veja que detonou a cúpula do Ministério dos Transportes.
Em sua defesa prévia, a maior revista semanal do País, também na última edição, publica uma espécie de "vacina" sobre as denúncias de Pagot. No meio da matéria "O primeiro round", que trata da CPI do Cachoeira, a revista escreve:
"Na semana passada, Luiz Antonio Pagot, ex-diretor do Dnit demitido no bojo do episódio que levou à queda do ministro Alfredo Nascimento, se disse vítima de uma trama que teria sido tecida contra ele exatamente por ter oferecido obstáculos aos interesses da Delta no órgão. Estranha linha de defedsa. Foi na gestão de Pagot que a Delta mais do que dobrou seu faturamento em contratos com o Dnit, alcançando 658 milhões de reais em 2010".
Como escrevi aqui na segunda-feira passada, a imprensa está se empenhando em transformar a CPI do Cachoeira na CPI da Delta, trocando o protagonismo de Demóstenes Torres e seu amigo Cachoeira por Fernando Cavendish, dono da Delta.
Alguns leitores discordaram da minha análise e sugeriram que a CPI do Cachoeira, já chamada "do submundo" ou de "todo mundo", seja também transformada na CPI da Mídia, o distinto quarto poder que pode condenar livremente todos os outros e se acha inimputável como os índios e as crianças.
Afinal, se a presidente da Associação Nacional dos Jornais, Judith Brito, já afirmou publicamente que a imprensa foi obrigada a assumir o papel de oposição ao governo em razão da fragilidade dos partidos, seria bom investigar se, além de divulgar fatos, a imprensa não estaria também criando os próprios fatos, em defesa de interesses políticos e econômicos de uns em detrimento de outros.
Concordo neste ponto com os colunistas da chamada grande imprensa: agora tem que investigar todo mundo, inclusive os bravos homens do "jornalismo investigativo" e seus honoráveis veículos.
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