Agora que o primeiro papa latino
americano teve a inédita iniciativa de escolher o nome daquele que Leonardo
Boff costuma chamar o primeiro depois do Único, é preciso lembrar também que o
Brasil é uma mãe que criou muitos Franciscos.
Dentre eles, é possível citar
três grandes ícones da Igreja Católica que, apesar de não trazerem o nome
Francisco na certidão de nascimento, doaram a vida pelos menos favorecidos, assim
como aquele de Assis. Dom Helder Câmara, Dom Paulo Evaristo Arns e Dom Pedro
Casaldáliga são os mais genuínos exemplos da unidade entre a fé e a ação
libertadora em favor dos pobres.
Todos eles foram lideranças
combativas contra a sanguinária ditadura que, assim como na Argentina, manchou
longos anos da história. Embora ameaçados, coagidos, nunca cederam a tentação do silêncio e sempre estiveram prontos a mobilizar e fortalecer todos que
acreditavam ser possível livrar o país dos tiranos fardados e buscar
incessantemente a inclusão social dos pobres.
Conhecido como Bispo Vermelho,
Dom Helder Câmara desejava uma
Igreja mais participativa, orientada para a defesa dos pobres e a favor dos
movimentos sociais. Depois do golpe militar, após um primeiro período de
convivência pacífica com o exército, ao ver a violação brutal dos direitos
humanos com a caça aos chamados comunistas, dom Helder passou a atuar em defesa
dos presos políticos e contra a tortura no Brasil. Depois de afastado da
arquidiocese viveu até o fim dos seus dias de maneira simples e franciscana.
Costumava dizer que "Quando dou de comer aos pobres, chamam-me santo,
quando respondo por que é que os pobres têm fome - chamam-me comunista".
Simples e combativo, Dom Paulo Evaristo Arns foi um
incansável defensor dos direitos humanos no Brasil, principalmente durante a
ditadura. Defendeu também os líderes sindicais nas greves, apoiou a campanha
contra o desemprego e o movimento pelas eleições diretas. Sua luta em defesa
dos direitos dos pobres e pelo fim da desigualdade social lhe valeu dezenas de
prêmios no mundo. Apoiou
fortemente o grupo Tortura Nunca Mais e foi um dos escritores do livro “Brasil:
Nunca Mais”, um doloroso relato da
repressão e tortura no Brasil. Sempre entendeu que a Igreja deveria fazer a
opção preferencial pelos pobres e oprimidos.
“Nada possuir,
nada carregar, nada pedir, nada calar e, sobretudo, nada matar”, esse sempre foi o lema de Dom Pedro Casaldáliga. Nascido na Espanha,
mas radicado no Brasil, Casaldáliga sempre foi um defensor das minorias e por
isso foi várias vezes ameaçado de morte. As últimas ameaças foram no final do
ano passado e no início deste ano e se deram em função da defesa que o bispo
faz do povo xavante na retomada da terra indígena Marãiwatsèdè. Durante o regime militar, foi alvo de processos de expulsão
do Brasil. É considerado
uma das principais vozes dos índios, dos sem terra e dos mais pobres.
Além desses três ícones da Igreja Católica,
dois outros Franciscos merecem ser lembrados. Um nasceu em Minas Gerais e
dedicou sua vida para atender a todos que o procuravam, pobres ou não. Autor de
verdadeiros best-sellers, Francisco Cândido Xavier direcionava tudo que recebia
com a venda dos livros para obras de caridade. Seus hábitos franciscanos de
viver marcaram toda a sua trajetória até o fim da vida.
Por fim, não dá pra falar de Franciscos que
dedicaram a vida às causas dos pobres sem falar de um Chico: Chico Mendes. O
seringueiro, reconhecido mundialmente pela defesa da floresta e de seus povos, indignou-se com as condições de vida dos trabalhadores e dos
moradores da região amazônica e tornou-se um líder do movimento de
resistência pacífica.
Assim como Francisco de Assis, todos optaram por uma forma
de luta baseada no amor e na paz. Sem nenhum gesto de violência ou arrogância e
nenhum vestígio de ódio.
Cada um a seu jeito, demonstrou o que é ser, de fato, um Francisco.
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